Stafin & Carvalho

O Projeto de Lei Complementar nº 108/2024, que integra o conjunto de normas de regulamentação da Reforma Tributária, propõe mudanças relevantes na tributação de heranças, doações e sucessões empresariais. O texto surge com o propósito de reduzir litígios e conferir maior previsibilidade ao sistema, especialmente em um tema sensível como o da transmissão patrimonial. No entanto, apesar de trazer avanços pontuais, o projeto ainda deixa de enfrentar questões estruturais que impactam diretamente o planejamento sucessório e a segurança jurídica dos contribuintes.

O que é o PLP 108/2024

O PLP 108 regulamenta dispositivos complementares da Reforma Tributária e estabelece regras para o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), além de tratar de aspectos relacionados ao IBS e à CBS. A proposta busca simplificar procedimentos, uniformizar entendimentos e reduzir disputas entre Fisco e contribuintes. Em tese, o objetivo é criar um ambiente de maior previsibilidade para a sucessão patrimonial e empresarial, diminuindo a judicialização que historicamente marca essa matéria.

Avanços positivos

Entre os aspectos positivos, o projeto fixa teto de multas em 100% do valor do tributo, reservando o percentual de 150% apenas para casos de reincidência, e prevê reduções para quem colaborar com o Fisco, o que estimula a conformidade tributária e a resolução consensual de controvérsias. Além disso, amplia hipóteses de isenção do ITCMD, reforçando a segurança jurídica do planejamento patrimonial, e estabelece que planos de previdência privada, como PGBL e VGBL, não serão tributados. Essas medidas representam um avanço importante em termos de previsibilidade e sinalizam um esforço de aproximação entre o sistema tributário e a realidade prática dos contribuintes.

Fragilidades e riscos práticos

Por outro lado, o texto ainda apresenta fragilidades relevantes. A ausência de um teto nacional para as alíquotas do ITCMD permite que cada Estado mantenha plena liberdade para fixar seus percentuais — muitos já próximos do limite de 8% —, o que pode acentuar disparidades regionais e elevar a carga tributária. Também não há solução concreta para a bitributação internacional, situação que afeta especialmente famílias com patrimônio no exterior e sucessões transnacionais. Soma-se a isso a composição desequilibrada da Câmara Nacional de Integração Tributária, que concentra maioria de representantes do Fisco em detrimento dos contribuintes. Esses fatores mantêm um ambiente de insegurança jurídica e abrem espaço para interpretações divergentes e potenciais conflitos.

O que falta ao Brasil

Quando comparado a outros países, o Brasil ainda está distante das melhores práticas internacionais. Nos Estados Unidos, o imposto sucessório incide apenas sobre grandes patrimônios, com isenções elevadas e foco na tributação de fortunas, não de famílias de classe média. Já na Alemanha, há benefícios fiscais expressivos para herdeiros que mantêm empresas familiares ativas, estimulando a continuidade dos negócios e a preservação de empregos. O PLP 108 não seguiu esse caminho e deixou de incorporar medidas voltadas à preservação produtiva e econômica da sucessão patrimonial, tratando a herança apenas como fato gerador de tributo, sem olhar para suas consequências sociais e empresariais.

Conclusão

O PLP 108/2024 representa um avanço importante na modernização do sistema tributário e na busca por maior segurança jurídica, mas ainda carece de ajustes estruturais que limitem a autonomia dos Estados e protejam a competitividade das empresas familiares. Em um contexto de transição e de novas regras sobre consumo e patrimônio, quem possui bens relevantes, investimentos no exterior ou estrutura empresarial familiar deve revisar com cautela seu planejamento sucessório. O desafio é equilibrar arrecadação e justiça fiscal, evitando que a reforma se torne apenas mais um instrumento de aumento de carga, em vez de um mecanismo de modernização e eficiência tributária.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *