Stafin & Carvalho

A Receita Federal editou a Instrução Normativa RFB nº 2.278/2025, que altera de forma significativa a forma como são apurados e comunicados indícios de crimes tributários e financeiros. A medida reflete a crescente preocupação do Estado em integrar a atuação administrativa fiscal com a persecução penal, reduzindo a margem para que ilícitos tributários permaneçam restritos ao campo da esfera administrativa.

Integração entre esfera administrativa e penal

Um dos pontos centrais da normativa é a determinação de que, sempre que forem identificados indícios de crimes contra a ordem tributária, como sonegação, fraude, ocultação de patrimônio ou lavagem de dinheiro, tais informações sejam obrigatoriamente compartilhadas com os órgãos competentes.

Isso reforça a aplicação do art. 83 da Lei nº 9.430/1996, que prevê a comunicação ao Ministério Público quando presentes indícios de crime tributário. Agora, a instrução normativa dá maior concretude a essa obrigação, padronizando o fluxo de informações e ampliando a cooperação institucional.

Expansão do alcance da e-Financeira

Outro aspecto relevante é a equiparação das instituições de pagamento — como carteiras digitais e plataformas de intermediação financeira — às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional (SFN) e do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).

Na prática, isso significa que operações realizadas por meio de fintechs e meios de pagamento eletrônicos passam a ser reportadas via e-Financeira, eliminando a assimetria existente em relação às instituições financeiras tradicionais. Essa alteração fecha brechas normativas que poderiam ser exploradas por contribuintes interessados em ocultar patrimônio ou movimentar recursos de forma paralela ao sistema bancário.

Fim das exceções e aumento da transparência

Até então, algumas modalidades de contas de pagamento estavam dispensadas da obrigatoriedade de comunicação. Com a mudança, todas passam a integrar o escopo da fiscalização, ampliando a transparência sobre movimentações financeiras e dificultando práticas de “blindagem patrimonial”.

Esse movimento está em consonância com os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no âmbito do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), que recomenda medidas mais rígidas de monitoramento para prevenir crimes de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.

Competência regulamentar da Cofis

A instrução normativa ainda confere à Coordenação-Geral de Fiscalização (Cofis) a atribuição de editar atos complementares para viabilizar sua aplicação prática. Esse poder regulamentar permite ajustes mais céleres e técnicos, evitando a defasagem entre a evolução das práticas ilícitas e a resposta normativa.

 

Impactos jurídicos e práticos

As mudanças trazidas pela nova normativa têm repercussões diretas para contribuintes, empresas e profissionais que atuam na área tributária:

  • Maior risco de responsabilização penal: irregularidades fiscais que antes poderiam ser tratadas exclusivamente no âmbito administrativo passam, com maior facilidade, a ser encaminhadas ao Ministério Público, potencializando a instauração de ações penais.
  • Obrigação de compliance mais robusta: instituições de pagamento e fintechs precisarão adotar mecanismos internos de controle e de reporte mais rígidos, sob pena de responsabilização administrativa.
  • Reflexos nos litígios tributários: a comunicação de indícios pode gerar investigações paralelas, tornando mais complexa a defesa de contribuintes em execuções fiscais ou autos de infração.

Considerações finais

A Instrução Normativa RFB nº 2.278/2025 representa um avanço na política de repressão a crimes tributários, alinhando o Brasil às melhores práticas internacionais de prevenção à lavagem de dinheiro e de combate à sonegação. Por outro lado, exige atenção redobrada de empresas e profissionais de contabilidade e advocacia, que precisarão adequar procedimentos internos e avaliar riscos não apenas no âmbito tributário, mas também no penal.

Mais do que uma mudança meramente formal, trata-se de uma medida que reforça a interconexão entre as esferas administrativa e criminal, sinalizando que condutas fraudulentas no campo fiscal dificilmente permanecerão sem repercussões judiciais.

 

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